BEM CONVERSA: Entrevista com Agnieszka Servaas, fundadora da Play Sustain Foundation: "A segunda circulação é uma vantagem hoje, não uma vergonha"

Um dos elementos mais importantes da discussão sobre o futuro do desenvolvimento sustentável – e sobre a construção de um senso de comunidade, responsabilidade e cooperação – é a educação.
Educação de que toda escolha importa, que a menor decisão pode levar a maiores mudanças e que, enquanto pensarmos apenas em nós mesmos, será difícil construir um mundo em que o bem comum conte. A verdade é que no meio de opiniões, mudanças de tendências e do culto ao consumo é fácil rejeitar a responsabilidade ou fazer vista grossa a ela. Precisamos ainda mais de iniciativas que nos lembrem que cada compra é feita às custas de alguém: do meio ambiente, de pessoas que trabalham em condições injustas ou das gerações futuras.
Com isso em mente, foi criada a Play Sustain, uma fundação polonesa que combina o cuidado com o meio ambiente com diversão e mostra que cuidar do futuro pode ser agradável e inspirador. Em vez de construir sua mensagem com base no medo da catástrofe climática, a Play Sustain muda a narrativa em torno do desenvolvimento sustentável: ela prova que escolhas conscientes, upcycling ou compras de segunda mão não são apenas responsáveis, mas também elegantes, criativas e interessantes. Isso inclui, entre outras coisas: consegui falar sobre isso com Agnieszka Servaas, a idealizadora da fundação e idealizadora do concurso Play Sustain Designer, cuja próxima edição está chegando ao fim, coroada por um desfile de moda upcycling e, pela primeira vez, moda digital.
Maria Jasek, Well.pl: A Play Sustain Foundation é na verdade a primeira iniciativa polonesa que aborda o tópico da moda circular de uma forma tão abrangente — por um lado, apoiando designers e, por outro, ajudando as empresas a introduzir as mudanças estratégicas necessárias. Qual é a história da Fundação e quando, como uma equipe de pessoas com experiência no setor têxtil, vocês perceberam que o mercado polonês exigia a criação de uma plataforma que integrasse designers, empreendedores e instituições que trabalham por uma indústria sustentável?
Agnieszka Servaas, presidente da Play Sustain Foundation: Fundamos a Play Sustain Foundation em 2019 junto com meu marido e parceiro profissional, Bertus Servaas. Estabelecemos a base com base em nossa paixão pela educação e na crença de que este é o melhor investimento na geração mais jovem. Muitos anos de experiência profissional e criação consistente de negócios com base na economia circular nos permitiram entender que o mercado de moda polonês precisa de uma plataforma aberta e definida.
Codificamos a ecologia da vida no DNA da fundação, que constitui a base de todas as nossas atividades. Ecologia da vida é a busca do equilíbrio no ser e no agir. Trata-se de construir todo um ecossistema baseado na relação entre pessoas-meio ambiente-negócios.
Essa é uma necessidade que se reflete em números. Embora a moda seja frequentemente vista como supérflua, ela é, na verdade, um dos pilares importantes da economia global e do mercado de trabalho que precisa ser reestruturado. Exatamente. Por exemplo, o site www.uniformmarket.com afirma que em 2025 o valor estimado do mercado global de vestuário será de US$ 1,84 bilhão, o que representa 1,63% do PIB mundial. A escala também é mostrada pelo nível de emprego: dos 3,62 bilhões de pessoas empregadas no mundo, 430 milhões trabalham na indústria da moda e têxtil. Por sua vez, a Statista Market Insights relata que, com o tamanho de mercado previsto de US$ 276,42 bilhões em 2025, a maior parte das receitas será gerada na China. Em resposta aos desafios de mercado que identificamos, tanto econômicos, ambientais e sociais (incluindo lacunas nas cadeias de suprimentos, a discrepância entre a conscientização ambiental e as escolhas do consumidor e a aceitação do excesso, que tem consequências quantitativas e qualitativas), decidimos que é necessário agir. Como assim? – por meio da educação. E assim, desde 2022, desde que a Play Sustain Foundation definiu sua missão e metas, temos construído a conscientização e a sensibilidade do consumidor por meio de várias atividades. Apoiamos o desenvolvimento de competências futuras, inclusive para designers de moda circular e pessoas que desejam criar um mercado baseado na economia circular.

No início do século XXI, o mercado secundário, principalmente na forma de brechós, era encarado com grande ceticismo - tecidos usados eram comumente associados à vergonha e poucas pessoas admitiam comprar roupas em brechós. Hoje, a narrativa é completamente diferente, pois usar o mercado secundário é uma vantagem, assim como a reciclagem criativa promovida pelos designers. Como é essa transformação – isto é, o crescente interesse e apoio à segunda circulação – vista “de dentro”? O que mais a educação pode, ou melhor, deveria fazer?
Estou transformando o mercado de vestuário há 25 anos. Ainda há muito a fazer no mercado de segunda mão, mas a percepção sobre roupas usadas mudou nesse período. O potencial é visto tanto pelos produtores têxteis quanto pelos consumidores. De acordo com dados publicados pelo Departamento de Pesquisa Statista em setembro de 2024, em 2023 o valor do mercado global de roupas usadas e revendidas foi estimado em US$ 197 bilhões. Com base nisso, espera-se que esse valor cresça rapidamente nos próximos anos, aumentando em cerca de US$ 100 bilhões até 2026. Esses são dados promissores se realmente influenciarem o status da produção de novas roupas, porque atualmente apenas um por cento simbólico dos têxteis é reciclado no final. Mais uma vez, a solução sistêmica é a educação.
Mudar as atitudes dos consumidores pode moldar o mercado de moda responsável melhor do que muitas regulamentações. É claro que estratégias abrangentes trazem os melhores resultados, por isso vale a pena investir em novas tecnologias que reduzam o desperdício têxtil. Usarei um exemplo comprovado: no VIVE Group, a empresa onde atualmente atuo como Presidente do Conselho Fiscal, temos promovido a ideia da reciclagem têxtil na Polônia e na Europa há três décadas. A VIVE cria, entre outros: o compósito VIVE TEXCELLENCE, usado para a produção de pequenos elementos arquitetônicos, e se esforça constantemente para fechar o ciclo têxtil.
Um novo projeto do VIVE Group é a boutique Dreslow – a primeira loja na Polônia 100% dedicada à moda circular. Dois locais estarão disponíveis a partir de maio: na Galeria Arkadiai de Varsóvia e na Galeria Młociny (a partir de 15 de maio). Dreslow oferece principalmente coleções de designers de upcycling, além de joias vintage e roupas de qualidade com história. É importante destacar que a boutique também desempenha um papel educativo, e a Play Sustain Foundation cocria seu conceito, moldando atitudes responsáveis entre os clientes. A segunda circulação também tem impacto na crescente popularidade dos bens de luxo: cada vez mais pessoas buscam produtos de marcas famosas no mercado secundário.

Até agora, o elemento mais visível das atividades da fundação foi o concurso Designer Play Sustain, que culminou em uma gala com a apresentação das coleções dos finalistas, que, aliás, estarão disponíveis em um mês. Há uma grande comunidade se reunindo em torno do Play Sustain. Qual é a atitude dos jovens designers em relação a esse projeto?
A competição Designers Play Sustain é de fato o empreendimento mais reconhecido da Fundação. Desde o início, queríamos “começar com uma nota alta” por vários motivos. A moda upcycling, na nossa opinião, é a moda do futuro. Se realmente — e não apenas declarativamente — queremos que a indústria se torne mais ecológica e que montanhas de lixo não ofusquem o nosso mundo, precisamos de iniciativas que efetivamente coloquem de volta à circulação as roupas já produzidas. Graças a valores compartilhados, estamos construindo uma comunidade de designers que querem usar seu talento e criatividade para uma boa causa. Os jovens criadores da Designers Play Sustain são pioneiros do movimento upcycling – eles provam que a moda circular não significa abrir mão da estética ou unificar o estilo. Pelo contrário: formas alternativas e artísticas de processar roupas existentes tornam a moda ainda mais individual e única. Embora falemos frequentemente de “jovens designers”, o concurso não estabelece um limite máximo de idade, como evidenciado pela diversidade dos nossos finalistas. O que eles têm em comum é uma nova perspectiva sobre moda e o desejo de mudar o mundo para melhor.
Que ferramentas e suporte a cooperação com a Play Sustain oferece aos designers?
Apoiamos o desenvolvimento de designers por meio de confiança, comprometimento e um programa educacional dedicado, que este ano inclui mais de 40 horas de workshops. Os participantes expandem suas competências empreendedoras e desenvolvem habilidades relacionadas às novas tecnologias. Alguns deles criarão e apresentarão suas próprias coleções virtuais em junho. Reuniões organizadas — como o Press Day ou o Boot Camp — e a cooperação com parceiros de competição abrem oportunidades reais para os participantes se desenvolverem no setor, bem como a chance de ganhar prêmios financeiros e materiais atraentes. Trata-se também, ou talvez devêssemos dizer – acima de tudo – de construir uma equipe de especialistas que apoiem o desenvolvimento de talentos. Uma dessas pessoas é o diretor de desfiles de moda e espetáculos de grande formato ao redor do mundo – Waldek Szymkowiak, que cria o Designers Play Sustain Gala e nos convenceu com sucesso a entrar no mundo da moda digital.

Fechar o ciclo da marca – criar um ciclo completo desde o design, passando pela produção e distribuição, até o uso e a reciclagem – é, em poucas palavras, o plano da moda circular. Em que estágio as marcas polonesas estão atualmente no contexto de implementação desses modelos e quais conceitos elas devem seguir?
As marcas polonesas estão cada vez mais declarando uma transformação verde, e muitas delas — especialmente as originais — agora colocam o cliente no centro de sua atenção. No entanto, boas práticas exigem não apenas mudanças na comunicação, mas sobretudo uma remodelação de premissas de negócios e uma mudança de atitude dos consumidores. O fabricante deve oferecer um produto valioso e de boa qualidade, produzido de maneira ética e utilizando mais cadeias de suprimentos locais. O cliente, ciente do processo de criação de uma roupa, compra então não apenas mais um item, mas também um determinado valor e uma história com os quais ele pode se identificar. Essa abordagem incentiva uma maior atenção plena nas compras, tanto porque a moda responsável geralmente custa mais quanto porque fazer uma escolha consciente se torna um ato de cuidar de algo mais do que apenas seu próprio guarda-roupa.
Claro, ainda há algum conflito — o preço ainda determina em grande parte as decisões de compra. No entanto, acredito profundamente que atividades educacionais como as realizadas pela Play Sustain Foundation e marcas de moda consciente nos ajudarão a finalmente abandonar a crença de que coisas em excesso podem levar à felicidade.
well.pl